Cânion da Morte do Alto

Nós cinco estávamos viajando durante umas quatro horas, fomos a pé então foi cansativo, mas finalmente chegamos no Cânion da Morte do Alto. O clima quente do deserto devagar era amenizado com o pôr do sol, eu estava descalço como sempre e graças as escamas pude andar sem dificuldades. Durante o trajeto me perguntei como estavam os numens que nos acompanhavam...

— Estamos quase no ponto marcado do mapa. Talvez comecemos a encontrar os bandidos aqui, é bom que estejamos prontos para eventuais confrontos! — Estava um pouco a frente do grupo e ao falar aquilo virei o rosto de leve para que pudesse olha-los. — Josh, Beit, quais são suas classes?

A viagem foi bastante cansativa e monótona. Esperava que o trabalho compensasse as horas gastas para chegar ao local. Foi justamente este pensamento que lhe lembrou de algo: sequer sabia o que fariam ali. Ficou ainda mais confuso ao ouvir Wedge falar sobre bandidos.

— Ah, é mesmo. Vocês ainda não me disseram o porquê de estarmos aqui. Se importariam em explicar o que faremos?

Os dois numens lhe incomodavam. Não sabia se eram aliados fiéis ou não, mas resolveu deixar o assunto para outro momento.

Todos ficamos sobrenaturalmente parados no mesmo lugar por horas sem perceber, até que chegou a madrugada. Que diabo de resposta eu havia recebido? Ele falou de sua classe social eu acho... Alguém apto a lutar não deveria saber sobre classes de combate? Achei um pouco estranho mas ignorei por ora, assim como a duvida de Kok.
Segui atrás de Josh e Beit que tomaram a frente, porém parei um pouco no topo da duna para tentar contabilizar o número de pessoas lá em baixo. Eu estava com medo de não conseguir descer aquele monte de areia com a mesma furtividade daqueles dois, então não o fiz de imediato.

—Esses dois não estão sendo um pouco inconsequentes? —Sussurrei para mim mesmo, mas talvez Aysen ou Kok pudessem ouvir se estivessem perto.

Fico um pouco confuso ao ouvir a resposta que Josh deu à pergunta de Wedge, porém, tento ser o mais otimista possível e a tomo como uma brincadeira. Decido não seguir os dois imediatamente, parando ao lado de Wedge.

— Não confio nesses dois. Acho melhor ficarmos de olho neles.

Digo, analisando brevemente o acampamento. Com certeza aquilo não terminaria bem. Tento não pensar muito e, antes que a dúvida pudesse me fazer recuar, jogo meu corpo contra a duna, deslizando por ela; deixar que Josh e Beit agissem sozinhos seria ainda pior. Me movimento cautelosamente, parando próximo a Aysen.

Aquilo estava muito estranho, Josh e Beit pareciam confiantes demais. Devia ou não confiar naqueles dois?
Meus pensamentos foram interrompidos pela voz de Aysen. Apenas assenti com a cabeça e olhei pelo buraco que Josh havia feito na tenda. Realmente, não parecia haver ninguém lá dentro. Entrei sorrateiramente, tentando não fazer barulho.
Olhei em volta, procurando pelo dinheiro.

Era realmente sério o plano de lutar contra todos aqueles caras? Um par de suicidas, muito certo. Não pude simplesmente ficar olhando, a final permaneci lá atrás para ajudar caso as coisas ficassem ruins. Me levantei em cima da duna sem mais preocupação com furtividade, desembainhei a rapieira em minha cintura e peguei o escudo que estava preso nas minhas costas.

— Que madrugada relaxante!

Murmurei em seguida saltando da duna para deslizar até o ponto mais baixo. Claro que eu não estava relaxado, mas tentava me concentrar para não tomar um tiro na cara ou um furo nas costas. Corri até fogueira o mais rápido que pude e graças ao peso a areia voava para todos os lados, eu empurraria qualquer um que estivesse na frente até que pudesse chegar em Josh e Beit.

Como esperado, estavam guardando o dinheiro dentro de um cofre. Ao menos era o que parecia. Os passos apressados de Wedge indicavam que eu deveria agir rápido. Precisava de um plano eficiente e sabia exatamente o que faria. Lembrei-me dos pés-de-cabra contidos nos kits que carregava comigo, e logo retirei uma das mochilas de minhas costas, pegando as duas ferramentas e fechando a mochila, colocando-a em minhas costas novamente. Em seguida, tentei levantar o cofre com as duas mãos, prendendo os pés-de-cabra de maneira improvisada ao meu cinto. Caso conseguisse e este não fosse muito pesado, esperaria um momento oportuno em meio ao conflito que acontecia lá fora para me aproximar à fogueira.

Conforme fui atravessando os inimigos fui percebendo que Josh e Beit estavam mais no controle do que eu pensei, esperei um pouco para responder Castellan... Todos estavam com medo das pistolas, pareciam desorganizados demais para atacarem juntos. Finalmente cheguei até os dois e lá eu simplesmente parei olhando o alvoroço, ninguém se aproximava o suficiente para que eu tentasse impedir. Diante dos meus olhos os bandidos caíam agonizando e em alguns pude perceber a peculiaridade das penas, não consegui identificar a origem daquilo, mas vinha por de baixo das roupas... Passava pela minha cabeça ser alguma espécie estranha de kemodo.
Levou pouco tempo para que ficássemos cercados, quando olhei para Josh e Beit eles estavam guardando as armas, em seguida jogaram as bombas de fumaça. Fiquei muito surpreso, nunca tinha visto aquilo e apesar de já ter tido contato com algumas toxinas nenhuma era desse tipo. As coisas estavam muito estranhas, foi então que ambos colocaram as máscaras e eu pude perceber que ajudar a mim e aos meus colegas não era uma opção. De imediato percebi que não poderia respirar aquilo então me detive para não gritar e desperdiçar folego.
"Mas que Numens filhos da puta" foi a primeira coisa que pensei. Imaginar que eu desci para tentar ajuda-los me deixava extremamente fulo, ainda mais depois daquele viadinho me chamar de "garoto". Sou mais velho que ele e não vou morrer com tão pouco!
Em uma situação na qual eu estivesse sozinho, com toda certeza eu tocaria o foda-se e tentaria arrebentar aqueles dois ali para pegar uma das máscaras, mas meus amigos estavam lá dentro da cabana e talvez não soubessem do gás... Eu precisava ajudar de alguma forma! Deixei que ambos corressem e assim que viraram as costas eu peguei a esfera que expelia o gás, tomei postura e a arremessei com toda minha força na diagonal. Se aquela porcaria acertasse uma cabeça acabaria em óbito.

— Plano? Siga aqueles dois, não vamos simplesmente deixar isso em branco, mas faça isso sem chamar a atenção. — Falei para Castellan tentando aspirar a menor quantidade possível de gás.

A visão estava dificultada mas usando a fogueira como orientação corri para a cabana que estavam Aysen e Kokb'ael, abri a parte da frente da tenda, entrei e fechei o mais rápido que pude. Aproveitando que o gás demoraria um pouco mais para passar pelo tecido, tomei folego e comecei a falar enquanto já desamarrava um dos sacos de dormir que estava em uma das mochilas do draco.

—Não temos muito tempo, aqueles numens de merda são traidores! Vocês dois devem prender o saco de dormir em volta da cabeça, tem um gás verde entrando e ele não parece muito saudável.

"Porra, sabia que não devia ter confiado naqueles dois." — Pensei. Preferi conter minha raiva momentaneamente, uma vez que precisávamos garantir nossa sobrevivência. Segui as instruções de Wedge e, com as mãos meio trêmulas, puxei o outro saco de dormir de uma das mochilas, desamarrando-o o mais rápido que pude. Não o amarrei de imediato, tratando de guardar os pés-de-cabra para então fazê-lo. Permaneci em silêncio, aguardando futuras ordens.

Sinceramente eu não tinha ideia se aquele plano funcionaria, talvez o gás não se dispersasse rápido o suficiente e nós três iriamos morrer daquela forma ridícula, mas não consegui pensar em mais nada rápido o suficiente.
Enquanto eu cobria a cabeça com o saco de dormir e esperava a sorte sorrir para nós, ouvi o forte barulho do choque de vento contra o tecido da barraca. Esperei um pouco imaginando se aquilo teria sido uma corrente de ar enviado por Deus ou coisa do tipo, até que pude ouvir a voz ressoar em meu ouvido. No mesmo instante tirei o saco de dormir da cabeça, até porque ninguém conseguiria falar com aquele gás enchendo seus pulmões, imaginei que já estivesse tudo bem.
Curioso, embainhei a rapieira e fui até a parte da frente da cabana sem pensar muito no tipo de pessoa que encontraria lá fora, desprendi o tecido da entrada.

— Mas o qu-...

Segurei minha própria fala, talvez pela surpresa no momento. Pensava em quem poderia ser aquele cara com asas, não me lembrava de ter visto coisa do tipo antes. De imediato fiquei sem reação, não falei com meus companheiros nem chamei atenção daquele cara, digo, não propositalmente.